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A variação da Língua Portuguesa ao longo do tempo

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[Atualizado em 5 de maio de 2021]

Mancebos e moçoilas,

Hoje, 5 de maio, é comemorado o Dia da Língua Portuguesa e da Cultura na Comunidade dos Países de Língua Portuguesa (CPLP). A data foi instituída pela organização em 20 de julho de 2009, por resolução da XIV Reunião Ordinária do Conselho de Ministros da CPLP, na Cidade da Praia, Cabo Verde. O documento dessa definição afirma que a Língua Portuguesa é “um vínculo histórico e um patrimônio comum resultantes de uma convivência multissecular que deve ser valorizada”. Eu concordo em gênero, número e grau! Afinal de contas, registra-se que essa língua é hoje o quinto idioma mais falado no mundo, a terceira mais falada no hemisfério ocidental e a mais falada no hemisfério sul – com milhões de falantes em todos os continentes.

Em 2019, a Organização das Nações Unidas para a Educação, Ciência e Cultura (Unesco) ratificou o dia 5 de maio como Dia Mundial da Língua Portuguesa. A decisão ocorreu no dia 25 de novembro, em Paris, durante a assembleia-geral da Unesco.

lingua10Além de 05 de maio, o dia da última flor do Lácio – como diria meu grande amigo Olavo Bilac – também é celebrado em duas outras datas: 10 de junho e 5 de novembro. A primeira é comemorada nos países lusófonos e foi instituída pela Assembleia da República de Portugal, em 1981, como homenagem ao autor Luís Vaz de Camões, cujo falecimento ocorreu nesta data em 1580. Camões é considerado uma das maiores figuras da literatura lusófona e um dos grandes poetas do Ocidente. Segundo pesquisadores, a obra “Os Lusíadas”, poema épico do autor, se tornou a principal referência para o estabelecimento da língua portuguesa moderna.

A segunda data (5 de novembro) marca o Dia Nacional da Língua Portuguesa no Brasil, instaurado por lei em 2006 para homenagear o escritor e político (e diplomata!) brasileiro Ruy Barbosa, nascido em 5 de novembro de 1849 e considerado um grande estudioso do idioma nacional.

Como sabemos bem, a língua portuguesa foi trazida ao Brasil no século XVI em virtude do dito descobrimento. O português era imposto como língua oficial às línguas nativas que havia aqui ou modificava-se dando origem a outros dialetos. Mas houve um longo processo para que o estabelecimento do idioma no território brasileiro. O contato entre os indígenas, os africanos e os vários imigrantes que vieram de algumas regiões da Europa contribuiu para o chamado multilinguismo. Assim, além da fase bilíngue pela qual passou a nossa língua, o multilinguismo contribuiu – e continua contribuindo – para a formação da identidade do português brasileiro.

Estudiosos afirmam que a implantação do português no Brasil é marcada por quatro períodos significativos: o primeiro momento vai da colonização até a saída dos holandeses do Brasil, em 1654; o segundo vai daí até a chegada da Família Real portuguesa ao Brasil, em 1808; o terceiro finda com a independência do Brasil, em 1822. Por fim, o quarto período se inicia em 1826, com a transformação da língua do colonizador em língua da nação brasileira.

Para entendermos melhor cada um desses períodos de transformação da nossa língua, procurei em meus alfarrábios e encontrei uma linha do tempo supimpa, com informações fornecidas pelo Museu da Língua Portuguesa! Vejam a seguir.

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História da Língua Portuguesa no Brasil:

1500 – Os cerca de 5 milhões de indígenas (estimativa), que habitam as terras ocidentais da América do Sul na época da chegada dos portugueses, falam mais de mil línguas, com dois grandes grupos principais: jê (no Brasil Central) e tupi-guarani (no litoral).


1530 – Com a criação das vilas de São Vicente (1532) e Salvador (1549), se dá a entrada oficial do Português no território. Os colonizadores adotam os idiomas indígenas. Mas depois surgem as línguas gerais – próximas às dos índios -, faladas pelos filhos de portugueses e nativas.


1538 – Os africanos escravizados trazem sua cultura (a banto e a sudanesa são as principais), também influenciando o Português. Do banto vêm línguas como o quicongo e o quimbundo. Palavras como bagunça, moleque e caçula são desse grupo e que falamos até hoje.


1580 – A língua geral paulista, de base tupi, é registrada por expedicionários. Os jesuítas e os bandeirantes são responsáveis por difundi-la. Para dizer gafanhotos verdes, fala-se tucuriurie, para esbofetear, eipumpa n sovâ. Ela desaparecerá no século 18.


1700 – Surge a língua geral amazônica, ou nheengatu, de base tupinambá. Algumas palavras: tapioca, açaí, tipóia. Ela ainda é falada por 8 mil brasileiros. Nasce o dialeto de Minas, mistura do Português com a evé-fon, falada por negros originários da região da Costa da Mina, na África.


1759 – Os jesuítas, que conheciam o tupi e ensinavam as línguas gerais aos índios, são expulsos. O Marquês de Pombal promulga uma lei para impor o uso do Português. No entanto, as três línguas (tupi, africana e portuguesa) coexistem por muito tempo no território.


1808 – A chegada da família real portuguesa marca a difusão da língua, com a criação da Biblioteca Real e das escolas de Direito e Medicina. O fim da proibição da existência de gráficas possibilita o surgimento de jornais e revistas e a massificação de uma maneira de falar.


1850 – Com a chegada de imigrantes e o início da urbanização, há a intensa assimilação do Português popular pelo culto e a incorporação de estrangeirismos. Em vez de “tu és”, fala-se “você é” e “nós fizemos” divide espaço com “a gente fez”.


1922 – A Semana de Arte Moderna leva o Português informal para as artes. Ao mesmo tempo, os migrantes vão para a cidade, e o rádio e as novidades urbanas chegam até o campo. Assim, as variedades linguísticas passam a se influenciar mutuamente.


1950 – Com o advento da TV, o americanismo chega ao Brasil e, com ele, novos termos. A criatividade na fala e nas manifestações artísticas movimentam o mundo das palavras. Expressões populares ganham a boca de todos, como “acabar em pizza” e “jogar a toalha”.


1980 – A Constituição de 1988 garante o direito de índios e negros residentes de antigos quilombos (local onde viviam escravos fugidos) preservarem seu idioma. Atualmente mais de 220 povos indígenas falam cerca de 180 línguas no território brasileiro.


1990 – A entrada da TV em mais de 90% dos lares acaba com o isolamento linguístico, mas as comunidades reagem às influências, absorvendo, adaptando ou rejeitando-as, mas sempre mantendo sua identidade. Surgem leis contra o analfabetismo. Nasce o “internetês”.

Assim como os demais idiomas, a nossa língua é viva, ou seja, se transforma e se reinventa com as pessoas ao longo do tempo, expressando uma maneira de organizar o mundo em nomes e estruturas linguísticas. Algumas alterações ocorrem naturalmente; outras são determinadas formalmente, como o Acordo Ortográfico implementado pela CPLP, em 2009, com o objetivo de facilitar o intercâmbio cultural e científico entre os países que têm o português como idioma oficial – Brasil, Portugal, Angola, Cabo Verde, Guiné-Bissau, Guiné-Equatorial, Moçambique, São Tomé e Príncipe e Timor-Leste – e ampliar a divulgação do idioma e da literatura em língua portuguesa.

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Como afirmou o escritor e professor Marcos Bagno, as mudanças na língua são inevitáveis. Ora bolas! O português que vocês estão lendo agora neste texto é muito distinto do português que se falava na minha época de mancebo, meus caros. Vocês já devem ter notado que este velhinho que vos fala, vez ou outra, usa algumas expressões um tanto quanto incomuns, não é mesmo? Pois bem. Mesmo com as constantes atualizações da língua, eu não consigo abandonar completamente esse “baronês”! 😁

Além dos termos antigos que deixo escapar com certa frequência, há muitos outros do meu tempo (e de antes) que também devem ser estranhos a vocês, tais como: janota, louçã, algibeira, bilontra, pândega, aboletar, melífluo, turuna, estroinice, apupar, insípido, entrudo, préstito, e por aí vai… Essas palavras faziam parte do vocabulário popular e cotidiano no século passado. Eram comumente usadas, inclusive, nos veículos de comunicação, como é o caso desta edição da Revista Fon-Fon de 1912. No entanto, com o passar do tempo, foram deixando de ser utilizadas à medida que as sociedades foram se desenvolvendo, como um processo de transformação natural.

Fiquei curioso sobre essas constantes mudanças e variações na nossa língua e decidi convidar a nossa querida mestra de Língua Portuguesa, Isabel Vega, para uma entrevista sobre o assunto. Numa animada conversa, a professora explicou os principais fatores que contribuíram na construção do português que falamos hoje e como o tema pode ser importante nos estudos para os concursos públicos, sobretudo para o Concurso de Admissão à Carreira de Diplomata (CACD). Confiram logo abaixo!

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ENTREVISTA COM A PROFESSORA ISABEL VEGA:

Geralmente, a maneira de falar se renova mais rápido do que o modo como se escreve. Por que isso ocorre?

Isabel Vega: A fala acontece de maneira muito mais espontânea do que a escrita. Por isso, a gente tem uma dificuldade grande na hora de escrever. Na hora de falar, a gente fala até demais, fala bobagem, depois é que a gente pensa, muitas vezes, no que a gente fala. E a escrita não. A escrita, como é algo que tem maior permanência, as pessoas têm muito mais cuidado ao escrever, porque a pessoa pode ser vítima de uma crítica. A língua oral é muito mais dinâmica, muito mais criativa, mais ágil, e muito menos permanente, com aquela ideia de que “as palavras o vento leva”. Então, a permanência, de fato, das regras é mais observada na língua escrita mesmo.

O que são os fatores de mudança da língua? Há alguns que influenciem mais do que outros?

I.V.: Existem inúmeros fatores de mudança na língua que podem ser agentes cognitivos, por exemplo, a maneira como a pessoa interpreta aquilo que foi dito, de uma maneira mais particular ou não, dependendo do contexto, da bagagem cultural que a pessoa tem de vida mesmo. Mas os fatores, de fato, que determinam na mudança coletiva da língua têm muito a ver com a idade das pessoas; com a formação delas; com as religiões, porque existe um arcabouço de algumas estruturas que diferenciam sempre um traço de cultura de outro; o fator espacial também, se é uma pessoa que mora num grande centro urbano ou numa propriedade rural, ou se mora no Brasil, em Moçambique, em Portugal. Então, a língua tem uma diversidade enorme, porque tem uma contribuição enorme em relação a espaço, a questão da classe social mesmo, quanto tempo tem de estudo, o quanto investe em cultura, em viagens. Existem inúmeros fatores. Eu não sei se existe assim, em especial, um que predomine sobre o outro, mas existem aqueles que a gente percebe mais, que chamam mais atenção. Eu diria que chama muita atenção a diferença em relação a menos escolaridade e a mais escolaridade e acho que uma linguagem mais envelhecida, das pessoas com mais tempo de vida, mais idosas, e a garotada, os adolescentes, essa diferença aí é bastante. Mas não sei se um fator predomina em relação a outro.

Qual foi o fator determinante para a diferenciação da nossa língua portuguesa do português de Portugal e como se deu essa modificação?

I.V.: O que os teóricos afirmam e o Gilberto Freire, no Casa Grande e Senzala, tem um capítulo extremamente importante que joga luz sobre esse assunto, é a influência do negro na vida da sociedade brasileira. E ele fala isso em diversos aspectos, em relação até a diminuição da mortalidade infantil, porque faz parte, e fazia no século XIX mais ainda, da cultura portuguesa, assim que as crianças nasciam, elas eram embrulhadas em panos e mais panos, não podiam entrar em contato com a luz porque os olhos eram muito frágeis e isso gerava uma mortalidade absurda de recém-nascidos porque o umbigo inflamava, enchia de bactérias. As crianças não pegavam sol, ficavam ali naquela escuridão daquele quarto, com um monte de pano amarrado, então era absurda a taxa de mortalidade. E quando os negros, as mucamas sobretudo, começaram a cuidar das crianças, a primeira coisa que elas fizeram foi algo que tinha a ver com a cultura delas, que é dar banho nas crianças. Então, as crianças nasciam e as mucamas davam banho nelas – o que faz parte da cultura africana –, começaram a vestir roupas leves, aquelas roupinhas de algodão, roupinhas de pagão como se dizia antigamente. As crianças já não ficavam num quarto escuro, mas numa penumbra, à luz do sol, e isso fez com que as crianças deixassem de morrer. Então, a influência do negro na sociedade brasileira é de uma importância absurda. E, assim como em coisas que a gente nem lembra, nem pensa nisso, que é a questão da mortalidade do recém-nascido, também é na linguagem. Porque os negros vieram para cá para interagir com os portugueses que aqui estavam, com os brasileiros, e ninguém ensinou a eles a língua portuguesa. Eles tiveram que aprender sozinhos. E, ao aprender sozinhos no contato com os outros, eles foram criando uma porção de estruturas que, hoje, a gente encontra mais associada à linguagem oral, justamente pela condição dos negros, de estar associada a uma circunstância muito mais oral do que escrita. Então, isso diferencia bastante a questão da colocação pronominal, a questão do negro usando próclise para diferenciar do comando do senhor, que usava ênclise. Isso é uma das coisas que contribuiu bastante não só em termos de vocabulário, mas em termos da estrutura mesmo da sintaxe.

Pode-se dizer também que a cultura indígena teve uma certa influência ou foi menos do que a cultura negra?

I.V.: Eu acho que menos. Eu acho que a cultura indígena vai favorecer bastante o vocabulário, algumas músicas, alguns ritmos, mas, em termos de língua portuguesa, não vejo essa mudança na estrutura. Porque a interação maior que houve, em termos de língua, foi realmente no trato dos portugueses e dos brasileiros com os africanos. Até pelo volume dessa interação, porque os índios não se prestaram muito, como costumam dizer os historiadores, à escravidão. Eles preferiam morrer a serem escravos e os negros não. Então, a gente chega a uma época, por exemplo, do começo do século XIX, em que a gente tem 3 milhões de habitantes e quase 2 milhões são negros. A influência de fato na língua é absurda e, por isso, a diferença maior com a língua portuguesa falada em Portugal.

Por que muitos termos e gírias utilizados antigamente – como “supimpa”, “mancebo”, “moçoila” – não são mais tão usados? Em linhas gerais, como ocorreu esse processo?

I.V.: Na verdade, sempre existe o embate entre o novo, que está chegando e quer conquistar o seu espaço, e aquilo que é o mais antigo, e é natural. Isso acontece em relação a roupas, em relação a tudo. As pessoas mais novas querem o seu espaço e têm que ter esse espaço para ter essa renovação. E as gírias também, elas representam um determinado grupo e uma faixa etária. Na minha época de criança, por exemplo, era muito comum dizer “mandar brasa”: “olha, vamos mandar brasa! Fazer tal coisa”, um pouco aí do resquício da jovem guarda. E hoje, por exemplo, quando eu chego para os meus alunos, até os do curso [preparatório para o CACD], e digo “olha, vamos mandar brasa!”, eles olham para mim assim com um risinho de “como assim?”; os do [Colégio] Pedro II riem e dizem: “o que é isso, professora? Mandar brasa? Vai ter churrasco?” (risos). Eles não entendem e para mim é algo absolutamente natural. Mas eles têm as gírias deles também. E a gente vai conhecendo as gírias deles também e é assim que a vida vai acontecendo, né? O novo precisa ter espaço. E aí, para o novo chegar, o mais antigo tem que deixar de ser usado. É mesmo uma renovação: o antigo tem que sair para dar espaço pro novo, e esse novo vai virar antigo e o outro novo vai vir, e é assim.

A respeito da realidade plural da língua, o que você pensa sobre a figura tradicional do gramático no imaginário coletivo? Como essa representação intensifica a ideia de que existe uma definição precisa e objetiva do que é certo e errado na língua?

I.V.: As pessoas têm esse padrão mesmo. E não precisa nem ser “o gramático”. O professor de Português já causa um certo constrangimento. Quando você está em algum lugar e alguém fala assim “nossa, ela é professora de Português”, todo mundo se cala porque começa a prestar atenção no que vai dizer, porque o professor de Português está ali com a vara de marmelo na mão para dar na cabeça de um que falar errado. Então, existe sim essa ideia de que o professor de Português é o carrasco que vigia maneira de falar das pessoas porque ele sabe, ele é o guardião da língua, ele é o guardião da pureza vernácula do idioma. E, infelizmente, há alguns professores mais antigos, alguns gramáticos mais antigos que gostam desse lugar de guardião. Então, acabam aumentando um pouco isso, com essa ideia de correção: a pessoa fala alguma coisa e o professor tem que corrigir, porque, afinal de contas, ele é o professor. E isso é uma grande bobagem, porque o espaço de correção é o espaço de sala de aula, não é o espaço de conversa. É um pouco arbitrário, um pouco autoritário. Mas as pessoas têm essa ideia do professor de Português e do gramático como aquele que sabe tudo, que não erra e que vigia os outros, porque ele, sim, sabe qual é a língua certa. E é uma bobagem porque isso gera, nas pessoas em geral, um certo trauma. Eu vejo muito os meus alunos do Clio, menino grande (risos), com graduação, pós-graduação, enfim, viagens e uma bagagem cultural enorme e acham que não sabem Português. Dizem: “ah, eu não sei Português. Português é muito complicado. É difícil. Como é que você sabe Português?”. E é uma matéria como outra qualquer, né? Mas o problema são esses traumas de incapacidade, como se a pessoa não se sentisse capaz, natural, na sua própria língua, no seu próprio idioma. Isso é uma pena, mas existe. Infelizmente, existe. A primeira aula que a gente tem no curso, a gente fala exatamente sobre esse tema, para desmistificá-lo. Porque a língua é a que nós usamos, como a roupa é a que nós vestimos.

Não existe um certo e um errado. É isso?

I.V.: Existem os certos, existem os errados, de acordo com os contextos em que essa língua é usada. Ontem mesmo um aluno me perguntou, a gente estava saindo da sala e ele falou assim: “professora, quando a gente usa assim ‘a ti te digo’… Porque eu li isso na bíblia, mas isso não é horroroso?! Isso está errado? Porque está na bíblia”. Bom, se está na bíblia tem que estar certo, né? (risos). É a ideia que as pessoas têm. Eu falei: “olha, ‘a ti te digo’ tem duas figuras de linguagem aí: uma é a inversão, porque você pega o objeto e traz pra frente; e a outra é o pleonasmo, que é o ‘te’. Então, pegar o ‘a ti’, trazer pra frente e repeti-lo na forma do ‘te’, oblíquo, na verdade, você está usando duas figuras de linguagem. Então, não está errado”. “Mas pleonasmo não é vício?” (risos). “Depende do contexto. Aí, não. Aí, é um reforço. O vício de linguagem é quando você precisa ser claro, ser conciso, e você usa a linguagem de uma maneira que não está adequada. Então, se você diz ‘eu tenho que subir para cima’, aí é um vício de linguagem, porque o ‘subir’ já está dizendo que é para cima. Agora, o ‘a ti te digo’ está só reforçando o realce no receptor, no interlocutor. Então, não é erro. Por que como é que você vai dizer que usar uma figura de linguagem é erro? Não é erro, é estilo”. “Ah, mas se eu escrever isso numa segunda fase [do CACD]?”. Aí, é erro. E por que é um erro na segunda fase? Não pelo uso do pleonasmo ou da inversão, mas porque, na segunda fase, eles [a banca] contam palavras e a linguagem tem que ser concisa e objetiva. O errado é você usar a figura de linguagem. Não o pleonasmo, é qualquer figura de linguagem. Então, a gente tem que, o tempo inteiro, estar com a cabeça ligada porque não é erro. Existe a ideia de adequação e não adequação, daquilo que flui mais para informar, de maneira mais objetiva, ou atrapalha a comunicação. É com isso que a gente trabalha o tempo todo.

O tema “variação da língua” costuma ser abordado nos concursos públicos de Carreiras Internacionais (CACD, OfChan, Abin e MDIC)? Como esse conteúdo costuma aparecer nas provas?

I.V.: Exatamente como eu estava falando ainda agora. É um tema bastante caro, sobretudo pro CACD, porque o diplomata é aquele que a gente imagina que é o que mais sabe e melhor sabe usar o idioma. Ele precisa representar o país, está numa situação de alto nível, de trocas, de convencimento, de persuasão, então ele precisa dominar o idioma de uma maneira muito grande. Ele tem que estar muito afinado com o idioma e, justamente, nas suas diversas realizações. E, por isso, o concurso tem duas fases, que são tão distintas. Na primeira fase, eles querem que o candidato tenha uma visão linguística da coisa, da língua; a questão da variação volta e meia é colocada; a língua oral muito mais valorizada do que a língua escrita porque, justamente, ela é mais autentica, mais dinâmica, mais representativa do nosso tempo. Eles querem essa visão linguística na primeira fase. Na segunda fase, eles esquecem a linguística e querem a gramática tradicional, mais castiça possível. Então, eles testam os candidatos das duas maneiras: do ponto de vista do domínio da língua teórico, no reconhecimento dos vários usos, e na questão prática, em que eles elegem a norma padrão. Isso volta e meia cai em concurso, na primeira fase, na segunda fase e, sobretudo, na escrita da segunda fase. Nos outros concursos, às vezes, cai em alguns textos, mas é mais diluído. No CACD, não. No CACD, é um assunto… é o primeiro capítulo do Celso Cunha [bibliografia para o concurso]. Então, é matéria de língua portuguesa.

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Fontes utilizadas no texto:

museudalinguaportuguesa.org.br

novaescola.org.br/conteudo/2604/a-lingua-e-viva

educacaopublica.rj.gov.br/biblioteca/portugues/0025.html

conversadeportugues.com.br/2015/05/dia-da-lingua-portuguesa

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Participação especial neste post:

Isabel Vega

Mestre em Literatura Brasileira pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). É professora de Língua Portuguesa na preparação para o Concurso de Admissão à Carreira de Diplomata (CACD) e nos demais cursos da área de Diplomacia e Carreiras Internacionais do Clio – Damásio.

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